***Osmar Martins
Quando pensamos em desenvolvimento socioeconômico de um país, notamos que o transporte tem função imprescindível. No Brasil, a malha rodoviária é de 1.720.909 km; destes, 12,4% são pavimentados, 9,1% planejados e 78,5% não pavimentados. E mais: 62% das cargas brasileiras escoam pela malha rodoviária, de acordo com informações do Ministério da Infraestrutura e do Anuário CNT do Transporte. Com tamanha demanda, fica claro entender por que a infraestrutura de transporte deve ser planejada, moderna e interligada: é fundamental para gerar valor, propiciar benefícios ao país e bem-estar à população.
Os desafios encontrados nessa equação são diversos – mais de 60 mil acidentes todos os anos, centenas de bloqueios por deslizamentos, paradas no trânsito por excesso de chuvas e outras intercorrências provenientes de baixa manutenção. Segundo o Anuário CNT do Transporte, realizado em 2022, 66% das rodovias avaliadas apresentam algum tipo de problema no estado geral. São nítidos os desafios e as oportunidades que o setor de infraestrutura pode trazer.
Rodovias brasileiras: topografia é um dos desafios
De maneira bastante resumida, um projeto rodoviário consiste na colocação de camadas de solo ou materiais sobre o terreno natural e/ou melhoramento das camadas existentes para que suportem os esforços oriundos do deslocamento de caminhões, ônibus e demais veículos que utilizam a rodovia. Existem critérios normativos para que os materiais que constituem a camada suporte e a camada final de rolamento atendam e proporcionem a qualidade desejada.
Ao analisar o solo como material de construção ou como material de suporte nas obras de infraestrutura, os desafios começam a surgir. O solo possui características peculiares que diferem dos parâmetros de resistência bem definidos nos projetos que envolvem estruturas de concreto e aço. Do ponto de vista da engenharia, o solo não é um material homogêneo, pois é formado pela decomposição das rochas que constituíam incialmente a crosta terrestre. Ele funciona como uma esponja absorvedora de água; chega um momento em que satura e consequentemente aumenta o peso dessa massa de solo, alterando o equilíbrio desse maciço. Então, surgem os fenômenos de escorregamentos/deslizamentos, voçorocas, dentre outros.
Por que a ocupação urbana interfere nas estradas e como mitigar?
O fator geológico contribui bastante para as ocorrências citadas acima. Mas há de se considerar a ação humana na ocupação em áreas de risco. Em uma análise mais macro, percebe-se a necessidade de políticas públicas voltadas para prevenção/mitigação desses eventos.
No Brasil, a ocupação urbana ocorreu principalmente ao longo de toda a costa, região com áreas de espessos depósitos de solos compressíveis de origem fluviomarinha, como na Baixada Fluminense e na Baixada Santista. Também em função da extensa rede hidrográfica brasileira aparecem depósitos aluvinonares de solos compressíveis em áreas continentais. São características de solo que impõem desafios e soluções tecnológicas para a execução de obras.
Nas regiões de transição de planalto para planície existem áreas com topografia acidentada/encostas. Nestas regiões ocorrem fenômenos naturais que envolvem tanto solo como rochas devido a intensa infiltração de água no subsolo, principalmente em regiões onde a precipitação de chuva é elevada como, por exemplo, as regiões de serra do mar nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraná e Santa Catarina.
A execução de uma obra nestas regiões exige cuidados especiais em função da intervenção com realização de cortes, aterros e drenagem para escoamento pluvial. É imprescindível a adoção de técnicas da engenharia geotécnica para prevenção de escorregamento e deslizamento de terra.
Podemos perceber os desafios que envolvem o empreendimento rodoviário. Para contornar estes aspectos existem equipes multidisciplinares envolvidas na elaboração dos diversos projetos além das equipes de planejamento e execução do empreendimento. Em geral os estudos e/ou disciplinas para construção de uma estrada englobam os seguintes projetos: viabilidade econômica; geométrico; obras de terra; terraplenagem; pavimentação; drenagem; obras de artes correntes; obras de arte especiais; desapropriação; interseções, retornos e acessos; sinalização; elementos de segurança; paisagismo e ambiental.
Momento de transição para a era tecnológica da engenharia
Em função do crescimento das cidades, a demanda por melhorias nos sistemas de transportes tem se tornado um desafio para as empresas de engenharia, pois os estudos para elaboração e gerenciamento desses projetos precisam de profissionais para garantir a prática, a segurança e o conforto da sociedade com o menor impacto ambiental para implantação dos empreendimentos.
Atualmente estamos passando por um processo de transição na elaboração de projetos e execução dos empreendimentos. As empresas estão se adequando para atendimento a requisitos normativos em diversas esferas, trabalhando para incorporar novas tecnologias, realizando ajustes de processos com o objetivo de alcançar os padrões de excelência requeridos pelas empresas do futuro.
As mudanças tecnológicas proporcionam mudanças de processo que auxiliam a concepção dos projetos e execução de obras rodoviárias, propiciando a racionalização de recursos e a diminuição dos custos operacionais.
A utilização da tecnologia da informação vem ganhando espaço nesse setor com implantação de diversas ferramentas e padronização do fluxo de informações. Bastante promissores são os príncipios do Lean Construction, que priorizam atividades que agregam valor, com foco na eliminação de qualquer tipo de trabalho que seja desnecessário na produção. É o caso dos estudos topográficos realizados com auxílio de drones, VANTs e eco-sonda em áreas mais restritas ou trabalhos sob a água.
Além disso, novos materiais também têm contribuído na maior durabilidade dos empreendimentos e na composição do pavimento. Uma alternativa que vem sendo utilizada é o desenvolvimento de materiais oriundos de pavimentos antigo, com novas aplicações nas obras geridas principalmente pelas Concessionárias. Aqui, há o ganho ambiental – esta reutilização diminui o descarte de material e o uso de materiais naturais provenientes das jazidas.
Por fim, há de se destacar a metodologia BIM, que assim como o Lean Construction e os drones, já é incorporada aos projetos da CRASA Infraestrutura em suas obras. A metodologia permite a interação entre as diversas disciplinas de um projeto, alimentando a base de informações, permitindo detectar e corrigir interferências, realizar simulações e análises, tudo ainda na fase de projeto. Além disso, o BIM proporciona a oportunidade de encontrar a metodologia construtiva mais adequada para cada projeto. Sem sombra de dúvidas, num futuro próximo, já será uma metodologia consolidada e, a longo prazo, toda essa tecnologia poderá mudar significativamente a malha rodoviária brasileira.
***Osmar Martins é Engenheiro Civil, Engenheiro Ambiental, especialista em Engenharia Rodoviária, Estruturas de Concreto e Fundações e Coordenador de QSMS e Engenheiro de Segurança do Trabalho do Consórcio Binário Porto de Santos, da CRASA Infraestrutura.
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